Um “empanturramento” de discursos: o episódio dos soluços do Banquete entre Aristófanes e Platão
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Resumo
O objetivo geral deste artigo é interpretar o episódio dos soluços de Aristófanes (185c-e) no Banquete de Platão como exemplo do uso que o filósofo faz de tópicas cômicas para seus próprios fins, algo que tem sido objeto de inúmeros estudos recentes. Em específico, se argumenta, a partir de elementos lexicais e dramáticos platônicos e aristofânicos, que a atribuição do fenômeno dos soluços a um “empanturramento” (πλησμονή) tem como objetivo satirizar o discurso de Pausânias e sua proposta erótico-pedagógica. Entende-se que tal plesmoné consiste em um “preenchimento por discursos” e é uma das ocasiões de aplicação, por Platão, da metáfora do discurso como um fluxo gustativo. Esta é bem estabelecida na tradição literária anterior e é especialmente manipulada pelo poeta Aristófanes para criticar oradores, políticos e sofistas. O comediógrafo, enquanto personagem e representante do seu gênero no diálogo, serve ao filósofo no projeto mais amplo de propor que a sabedoria não é um produto acabado que possa ser adquirido por meio de uma transação.
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