Escuta, estímulo e distração: os impactos neurológicos da pandemia na memória e apreciação musical

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Braulyo Oliveira
Thiago Menini

Resumo

O ponto de partida do presente artigo é a ideia de uma crise na escuta musical descortinada pelas primeiras apresentações da Música Nova. Theodor Adorno lamentou o reduzido número de ouvintes capazes de uma escuta à altura das exigências da produção musical mais consequente; ele suspeitava que a atenção e a memória demandadas para a escuta da música de vanguarda diferiam daquelas necessárias para a música típica da sociedade de mercadorias. Em seguida, demostramos como esta crise se intensifica através da imposição de um regime único de atenção-memória, provocado pela interação dos corpos com a tecnologia contemporânea na sociedade da hiperinformação. Por último, apresentamos a hipótese de que a COVID-19 molda biologicamente nossos corpos, adaptando-o às exigências do regime de atenção-memória contemporâneo, enquanto que, por outro lado, bloqueia a forma de escuta reivindicada não só pela música de vanguarda, mas também pela tradição erudita.         

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Artigos
Biografia do Autor

Braulyo Oliveira, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

Possui graduação em Filosofia pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Mestrado e Doutorado em Filosofia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com trabalhos que versam sobre a filosofia da música de Theodor Adorno e a sua relação com a música e a concepção musical de Arnold Schönberg e a sua escola. Na sua tese, O Adorno tardio e o jovem Schönberg, aborda a participação do filósofo e músico frankfurtiano nos famosos Internationale Ferienkurse für Neue Musik, em Darmstadt, mais especificamente, o curso de 1955: "Der junge Schönberg". Também possui formação em Música, obtida no Conservatório Estadual De Música Haidée França Americano, cuja frequência nos cursos de piano e violino se deu desde a infância. Tem experiência na área de Estética e Filosofia da arte, com ênfase em Música. Atualmente, o seu objeto de estudo é o pensamento de Theodor Adorno e as contribuições estéticas/teóricas da Segunda Escola de Viena.

Thiago Menini, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)

Doutorando, desde 2019, do programa de pós-graduação em Comunicação Social da UERJ orientado pelo prof. Vinicius Andrade Pereira; Bacharel em Comunicação Social pela Universidade Federal de Juiz de Fora (2011); Mestre pela mesma instituição na área de concentração de Estéticas, Redes e Linguagens (2016).

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